O escritor Ruy Castro publicou recentemente um artigo instigante dizendo que ‘pensar dói’.
Relata que pesquisadores universitários holandeses chegaram à essa conclusão após analisar cerca de 358 tarefas cognitivas.
A análise foi feita com o auxílio de um programa especial da Nasa, o que dá mais autoridade do que a de pesquisadores limitados a só usar o cérebro.
Certas atividades cerebrais, como fazer cálculos matemáticos, ou tomar decisões que envolvam um sim ou não de vida ou morte, provocam sensações orgânicas que podem ser classificadas como dolorosas.
Segundo o estudo, quanto maior o esforço mental, maior o desconforto físico.
Não é preciso pensar muito para se chegar a esse óbvio.
O estudo não considera a hipótese de todo o esforço mental ser relativo.
Ele pelo menos admitiu certa possibilidade de diferença entre as pessoas, citando estudantes universitários e militares — imagino que cada um numa ponta do espectro cognitivo.
Continuando, Ruy Castro diz que o que o espanta é a conclusão que ‘pensar dói’ tenha vindo de uma instituição da Holanda, país admirado por produzir pensadores em tantos ramos.
Eram holandeses os dois pilares da filosofia (Erasmo e Spinoza) atividade cuja única ferramenta é o pensamento.
E não há registro que Erasmo e Spinoza sofressem de lombalgia ou dor de dentes por pensar.
Holandeses foram pintores, como Van Gogh, Rembrandt, e pintar envolve decidir em um segundo se se dá esta ou aquela pincelada.
E alguns dos jogadores mais cerebrais da história do futebol eram holandeses — Cruyff, Van Basten.
Vieram provar que nem sempre o cérebro precisa estar na cabeça.
Os holandeses inventaram também a fita cassete, o CD e o DVD, e temos de lhes ser gratos por isso.
Mas depois os desinventaram —e pensar nisso, sim, dói.
(*) GABRIEL NOVIS NEVES é médico e ex-reitor da UFMT.